O estado de mal epiléptico é uma das principais emergências neurológicas e um tema recorrente tanto na prática clínica quanto nas provas de residência médica. O manejo rápido e correto desse quadro pode ser decisivo para o prognóstico do paciente, já que atrasos ou escolhas inadequadas de conduta podem resultar em lesão cerebral irreversível e até óbito.
Além de ser uma situação crítica no dia a dia de hospitais e prontos-socorros, o estado de mal epiléptico está entre os temas mais cobrados em concursos de residência, especialmente nas questões de neurologia e clínica médica. Estar atualizado sobre a definição operacional, os critérios diagnósticos e a sequência de tratamento recomendada nas principais diretrizes é fundamental para evitar erros, salvar vidas e garantir um bom desempenho nas provas.
Este artigo apresenta um guia prático e atualizado sobre o diagnóstico, abordagem inicial e tratamento do estado de mal epiléptico, baseado em recomendações atuais e exemplos de questões de residência médica, como a cobrada recentemente pela UNESP. Ao final, você vai saber exatamente o que fazer diante desse desafio clínico e estará mais preparado para acertar qualquer questão sobre o tema na sua prova.
O que é estado de mal epiléptico?
O estado de mal epiléptico é definido como uma condição clínica caracterizada por atividade convulsiva persistente, geralmente por um período prolongado ou por crises recorrentes sem recuperação completa da consciência entre os episódios. A definição clássica considerava o estado de mal quando a crise convulsiva durava 30 minutos ou mais, ou ainda quando o paciente apresentava duas ou mais crises seguidas sem restabelecimento do nível de consciência.
No entanto, as diretrizes atuais adotam um conceito operacional mais prático: considera-se estado de mal epiléptico toda crise convulsiva que se mantém por mais de 5 minutos ou a ocorrência de duas ou mais crises sem recuperação total da consciência entre elas. Essa mudança é importante porque, na prática clínica, aguardar 30 minutos para iniciar o tratamento pode trazer riscos graves de dano neurológico ao paciente. Por isso, a intervenção deve ser feita já a partir dos 5 minutos de crise contínua.
O reconhecimento rápido do estado de mal é essencial, pois a falha nos mecanismos naturais de término da crise pode levar a lesão cerebral permanente, alterações metabólicas graves e, em casos extremos, risco de morte. Por isso, o tema é considerado prioridade tanto na atuação em emergência quanto nos processos seletivos para residência médica.
Diagnóstico do estado de mal epiléptico
O diagnóstico do estado de mal epiléptico é essencialmente clínico e depende da identificação rápida de sinais e sintomas característicos. Os principais critérios para suspeitar do quadro são:
- Crise convulsiva contínua por mais de 5 minutos
- Duas ou mais crises convulsivas sucessivas, sem recuperação completa do nível de consciência entre elas
Os sintomas variam de acordo com o tipo de crise, mas as manifestações mais comuns incluem movimentos tônico-clônicos generalizados, abalos musculares repetitivos, perda de consciência, automatismos e, em alguns casos, envolvimento focal, como movimentos anormais em apenas um membro ou em metade do corpo. Nos casos mais graves, o paciente pode apresentar complicações sistêmicas, como alteração do padrão respiratório, arritmias, hipertermia, desidratação e alterações metabólicas importantes (por exemplo, hiperglicemia ou acidose).
É importante diferenciar o estado de mal epiléptico de outras condições neurológicas ou metabólicas que podem simular convulsões prolongadas, como síncope, crise psicogênica ou distúrbios metabólicos severos. Sempre que possível, deve-se obter uma história clínica detalhada, considerar doenças de base (como epilepsia prévia, lesões neurológicas, distúrbios metabólicos ou uso de medicamentos) e realizar exame físico direcionado.
O diagnóstico não deve atrasar o início do tratamento. Em situações típicas, o reconhecimento clínico do estado de mal epiléptico justifica a rápida introdução das medidas terapêuticas, mesmo antes da confirmação por exames complementares.
Conduta inicial e estabilização do paciente
A abordagem do estado de mal epiléptico começa pela segurança do paciente e do ambiente. Os primeiros minutos são críticos para evitar complicações e lesões secundárias. Veja os passos iniciais recomendados:
1. Garanta a segurança:
Afastar objetos ao redor para evitar traumas, posicionar o paciente em local seguro e, se possível, em posição lateral de resgate para evitar aspiração.
2. Não tente conter os movimentos nem introduzir objetos na boca:
Manobras como tentar imobilizar o paciente ou manipular sua língua não são recomendadas e podem causar mais danos do que benefícios.
3. Avaliação e monitorização:
Inicie o monitoramento dos sinais vitais (frequência cardíaca, pressão arterial, saturação de oxigênio, frequência respiratória). Mantenha oxigenação adequada, se necessário com máscara de oxigênio.
4. Estabilize as vias aéreas e avalie glicemia capilar:
Hipoglicemia e hiperglicemia podem ser causas ou agravantes da crise, portanto a glicemia deve ser medida rapidamente.
5. Acesso venoso:
Garanta um acesso venoso periférico o quanto antes para administração de medicamentos e coleta de exames laboratoriais, se possível.
6. Acione o serviço de emergência:
Se o quadro persistir por mais de 5 minutos ou se o paciente apresentar sinais de gravidade, acione imediatamente o suporte avançado.
A estabilização do paciente é a base para um tratamento eficaz. Qualquer atraso nessas etapas pode aumentar o risco de lesão cerebral irreversível e mortalidade.
Sequência de tratamento do estado de mal epiléptico
Após a estabilização inicial, o tratamento do estado de mal epiléptico deve ser iniciado sem demora. O objetivo principal é interromper a crise convulsiva o mais rápido possível para reduzir o risco de lesão neurológica. O tratamento é dividido em etapas, conforme preconizado pelas principais diretrizes.
1. Primeira etapa: benzodiazepínicos
Os benzodiazepínicos são a primeira escolha para abortar a crise.
- Opções disponíveis no Brasil:
- Midazolam (intramuscular ou intravenoso)
- Diazepam (intravenoso)
- Lorazepam (quando disponível, intravenoso)
Se o paciente possui acesso venoso, a administração IV é preferencial. Em ambiente pré-hospitalar ou na ausência de acesso, o midazolam intramuscular é alternativa eficaz.
Doses usuais:
- Midazolam IM: 10 mg em adultos
- Diazepam IV: 10 mg em adultos (pode repetir após alguns minutos, se necessário)
Se não houver resposta em 5 minutos, pode-se repetir a dose ou avançar para a próxima etapa.
2. Segunda etapa: fármacos anticrise de manutenção
Se a crise não for controlada após os benzodiazepínicos, inicia-se o tratamento com medicamentos de manutenção, normalmente por via intravenosa.
- Opções principais:
- Fenitoína ou fosfenitoína
- Ácido valproico
- Levetiracetam
- Fenobarbital
- Lacosamida
No Brasil, a fenitoína intravenosa é o fármaco mais utilizado, administrado lentamente (velocidade máxima de 50 mg/minuto em adultos), sempre monitorando efeitos adversos.
3. Estado de mal refratário
Se, mesmo após as duas etapas, a crise persistir, o quadro é considerado estado de mal epiléptico refratário.
- Medidas adicionais incluem sedação com drogas como propofol, midazolam, ketamina ou outros, geralmente em ambiente de terapia intensiva, com monitorização rigorosa (idealmente com eletroencefalograma contínuo).
- Pode ser necessário suporte avançado, intubação e medidas de manutenção de funções vitais.
4. Considerações especiais
- Sempre que possível, investigar e tratar causas precipitantes (distúrbios metabólicos, infecções, medicações, etc).
- Em casos como hipoglicemia ou hiperglicemia grave, a correção metabólica deve ocorrer em paralelo ao manejo da crise.
O início rápido e a sequência correta de tratamento aumentam as chances de controle da crise, minimizam sequelas e salvam vidas.
Questão clínica de prova: análise e resolução
Um dos pontos de destaque do vídeo foi a análise de uma questão real de residência médica (UNESP 2022), que ilustra como o tema costuma ser cobrado nas provas. Vamos resumir o caso apresentado:
Caso clínico:
Homem de 65 anos, antecedentes de hipertensão, diabetes e dislipidemia, apresenta movimentos involuntários no braço direito e face há 2 horas, sem interrupção. Exame físico: estado geral regular, desidratado, PA 13×9, HGT 560. Movimentos clônicos em membro superior direito e automatismos mastigatórios.
Pergunta:
Qual o diagnóstico e a conduta sequencial, além da monitorização?
Alternativas discutidas:
- Estado de mal epiléptico x crise convulsiva isolada
- Sequência correta de medicação: benzodiazepínico seguido de fenitoína
- Correção da glicemia elevada
Comentário:
O caso é clássico de estado de mal epiléptico, já que o paciente apresenta crise convulsiva por tempo superior a 5 minutos (neste caso, 2 horas). O manejo correto, segundo as diretrizes e a discussão do vídeo, envolve:
- Administração de benzodiazepínico (midazolam IV) como primeira medida para abortar a crise.
- Início de fenitoína intravenosa para manutenção e evitar recorrência.
- Correção da glicemia elevada (hiperglicemia), pois distúrbios metabólicos podem ser causa ou agravante das crises.
O erro mais frequente nessas questões é pular o uso do benzodiazepínico e ir direto para a fenitoína, ou ignorar causas metabólicas associadas. Por isso, é fundamental seguir a sequência de tratamento e lembrar que o diagnóstico é clínico, baseado no tempo de crise e no estado do paciente.
Dica para prova:
Sempre priorize a interrupção rápida da crise com benzodiazepínico, depois fármaco de manutenção e, simultaneamente, corrija alterações metabólicas graves.
Considerações especiais
Além da abordagem sequencial padrão, alguns pontos merecem atenção especial no manejo do estado de mal epiléptico, tanto na prática clínica quanto nas provas de residência:
1. Alterações metabólicas associadas
Distúrbios metabólicos, como hipoglicemia, hiperglicemia (como no caso apresentado), hiponatremia, insuficiência renal e distúrbios ácido-básicos, podem desencadear ou agravar crises convulsivas. Sempre avalie e corrija essas alterações paralelamente ao tratamento da crise, pois o controle metabólico é essencial para o sucesso terapêutico e prevenção de recidivas.
2. Individualização da conduta
O acesso venoso nem sempre está imediatamente disponível. Nessas situações, o uso de midazolam intramuscular pode ser fundamental para interromper a crise rapidamente até que o acesso seja obtido.
3. Abordagem em populações especiais
Pacientes idosos, gestantes, crianças e portadores de comorbidades exigem ajuste de doses e vigilância reforçada quanto aos efeitos colaterais dos medicamentos anticonvulsivantes.
4. Diagnóstico diferencial
Nem toda crise prolongada é estado de mal epiléptico. Diagnósticos diferenciais importantes incluem eventos psicogênicos, síncopes, encefalopatias e intoxicações. A avaliação clínica detalhada e o acompanhamento do paciente após o término da crise são indispensáveis.
5. Monitorização contínua
Em casos graves ou refratários, é indicada a monitorização intensiva, de preferência com eletroencefalograma, para avaliar resposta ao tratamento e detecção de crises não convulsivas.
Ficar atento a esses detalhes é o que diferencia o médico preparado na prática clínica e nos processos seletivos de residência.
Com isso…
O estado de mal epiléptico é uma das emergências neurológicas mais importantes, exigindo reconhecimento rápido, abordagem estruturada e tratamento imediato. Saber diferenciar uma crise isolada de um estado de mal, conhecer as etapas do manejo — da estabilização inicial ao uso sequencial de benzodiazepínicos e anticonvulsivantes — e estar atento às causas metabólicas são diferenciais tanto para salvar vidas quanto para garantir um bom desempenho nas provas de residência médica.
A atualização constante em protocolos e a prática de raciocínio clínico em cenários de emergência são fundamentais para o médico moderno. Ao dominar os pontos-chave apresentados neste artigo, você estará mais preparado para a rotina hospitalar e para conquistar sua vaga na residência.
Prepare-se com o Medtask
Se você quer aprofundar seus conhecimentos em temas relevantes para a residência médica, confira o Curso Extensivo R1 do Medtask.
Tenha acesso a aulas objetivas, questões inéditas, inteligência artificial para otimizar seus estudos e o suporte de uma equipe de professores das principais instituições do país.
Garanta a melhor preparação para sua prova de residência:
medtask.com.br/#/extensivo